domingo, 26 de junho de 2016

Pesquisas de Ponta em Direito – Parte 2

Continuando a série de postagens sobre pesquisas de ponta na área de direito (Parte 1 aqui), trago novos exemplos que merecem nossa atenção – dessa vez internacionais.

Um exemplo notável de grande área interdisciplinar é a interseção entre direito, lógica, inteligência artificial (IA) e informática, cujas repercussões práticas prometem mudar radicalmente a profissão jurídica. A primeira conferência internacional sobre direito e IA ocorreu em Boston, EUA, em 1987, isto é, bem antes da rede mundial de internet. De lá para cá a IA tem avançado: o escritório de advocacia Hodge Jones & Allen, em Londres, Inglaterra, é um dos pioneiros em usar um modelo preditivo para o resultado de casos, a fim de avaliar a viabilidade de dar andamento a processos jurídicos; a empresa forneceu a Andrew Chesher, professor da University College London, uma série de dados sobre os resultados de 600 casos concluídos em doze meses; ele usou uma combinação de técnicas estatísticas para analisar os fatores que contribuem para que os casos sejam ganhos ou perdidos, os danos assumidos pelos requerentes em casos de sucesso e os custos recebidos pela empresa. Não muito longe dali o Agent Applications, Research and Technology (Agent ART) Group, da Liverpool University, está desenvolvendo formas de aplicar a IA ao campo jurídico, como o processamento de textos, busca e análise de dados, automatizando a rotina de tarefas jurídicas, tornando sua execução mais rápida e barata.[1]

Os estudos em direito, lógica, IA e informática ganharam tanto relevo, que a Stanford University possui um centro de estudos apenas para isso: The Stanford Center for Legal Informatics (CodeX), operado conjuntamente pela Stanford Law School e pelo Stanford Computer Science Department.[2]

Outro campo interdisciplinar relacionado ao departamento de direito e à profissão jurídica que tem se mostrado produtivo é o Law and Economics Movement ou Análise Econômica do Direito[3]. A ideia central é aplicar os conceitos e os estudos econômicos, incluindo ferramentas matemáticas, para compreender, descrever e melhorar as práticas jurídicas. A ideia geral da maioria das análises econômicas é traçar as consequências de assumir que as pessoas são mais ou menos racionais em suas interações sociais – em regra, buscando seus objetivos e tentando maximizar seus benefícios e minimizar seus custos. No caso de atividades jurídicas, essas pessoas podem ser criminosos, promotores, partes no processo, contribuintes, auditores fiscais, trabalhadores – ou até estudantes de direito. Ou seja, análises econômicas vão muito além de dinheiro e capitalismo; elas são amplas o bastante para serem uma investigação do comportamento humano, razão pela qual têm afinidades com a teoria dos jogos. As pesquisas nessa área já são tão reconhecidas, que a The University of Chicago mantém um periódico dedicado apenas ao campo, The Journal of Law and Economics[4]. A faculdade de direito dessa universidade, inclusive, se destaca por ter um programa interdisciplinar que assume explicitamente que o estudo do direito não é uma disciplina autônoma: desde o primeiro dia de aula os estudantes dessa instituição tem sua atenção dirigida a insights das ciências sociais, das humanidades, e das ciências naturais[5].

Por fim, quero mencionar uma última área de interseção: direito e neurociências. Financiada pela John D. and Catherine T. MacArthur Foundation, o Research Network on Law and Neuroscience, da Vanderbilt University, é um centro de pesquisa que investiga problemas que se encontram entre a neurociência e a justiça criminal: 1) investiga estados mentais relevantes ao direito e processos de tomada de decisão em advogados, testemunhas, jurados e juízes; 2) investiga em adolescentes a relação entre o desenvolvimento do cérebro e as capacidades cognitivas; e 3) avalia a melhor forma de fazer inferências sobre os indivíduos a partir de dados neurocientíficos baseadas em grupos[6]. Outras questões desse campo interdisciplinar incluem: (a) Trata-se de uma legítima defesa alegar que um tumor ou uma lesão cerebral atenua um crime? (b) como os cérebros de menores diferem dos cérebros de adultos em sua capacidade de tomada de decisões e controle dos impulsos? (c) pode a neurociência informar normas de condenação, oferecendo uma melhor previsão de reincidência? (d) podem as novas tecnologias de imagem cerebral ser aproveitadas para novos métodos de reabilitação? (e) quem deve ter acesso a informações sobre nossos cérebros? (f) como deve o júri avaliar a culpabilidade quando a maioria dos comportamentos são movidos por sistemas inconscientes do cérebro?[7] Essas e outras questões nada triviais e bastante complexas estão muito longe de serem respondidas por qualquer pesquisa que tenha (até hoje) se apresentado como especificamente jurídica, como a dogmática jurídica, e, no entanto, são perguntas da mais alta relevância para a sociedade e para o direito.




[1] CROSS, Michael. Role of Artificial Intelligence in Law. Published February 19, 2015, em <http://raconteur.net/business/time-for-technology-to-take-over>. Acesso em 5 de fevereiro de 2016.
[2] Detalhes sobre o centro de estudos no site da instituição: <http://codex.stanford.edu/>. Acesso em 5 de fevereiro de 2016.
[3] POSNER, Richard. Values and Consequences: An Introduction to Economic Analysis of Law. In: JOHN M. OLIN LAW & ECONOMICS WORKING PAPER NO. 53, 1988. Disponível em <http://www.law.uchicago.edu/files/files/53.Posner.Values_0.pdf>. Acesso em 5 de fevereiro de 2016.
Mais sobre a análise econômica do direito, os verbetes The Economic Analysis of Law e Law and Economics, respectivamente, na Stanford Encyclopedia of Philosophy e na Internet Encyclopedia of Philosophy, cujos endereços, respectivamente, são: <http://plato.stanford.edu/index.html> e <http://www.iep.utm.edu/>. Acesso em 5 de fevereiro de 2016.
[4] Detalhes sobre o periódico em <http://www.journals.uchicago.edu/toc/jle/current>. Acesso em 5 de fevereiro de 2016.
[5] Detalhes sobre o programa interdisciplinar da Universidade de Chicago: <http://www.law.uchicago.edu/projects/interdisciplinary>. Acesso em 5 de fevereiro de 2016.
[6] Detalhes sobre o Research Network on Law and Neuroscience: <http://www.lawneuro.org/>. Acesso em 5 de fevereiro de 2016.
[7] EAGLEMAN, David M. Neuroscience and the law. Houston Lawyer 16.6 (2008): 36-40. Disponível em <http://www.thehoustonlawyer.com/aa_mar08/page36.htm>. Acesso em 5 de fevereiro de 2016.

Um comentário:

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